terça-feira, 3 de novembro de 2009

Manifesto Pessoal do Deserdo

Pai, quero que tu me deserde.
Guarda contigo tuas dívidas, defeitos e vícios.
Não admito carregar nem dar mais vida a atributos
desprezíveis.
Convoco todas as minhas entranhas, massas e líquidos.
Do fundo do meu corpo, abominemos essa continuidade.
Não podemos e não seremos parte dessa espiral.
Viva as linhas paralelas!

Pai, quero que tu me deserde.
Esqueça todos os dramas e solilóquios do almoço.
Você está sempre bêbado.
Pai, quero que rasgues a certidão de culpa por teres me posto no mundo.
A partir daqui, assumo eu.
Pai, quero que diante de todos: meus rins, minhas amigdalas, meus intestinos, quero que diante de todos você se ajoelhe e ateste a carta de insanidade que me habita.

Pai, eu não estou louco.
Pai, eu não estou puto.

Pai, quero não me lembrar das suas dívidas.
Quero não tê-las.
Afinal, meu nome ficou sujo foi com as tuas pegadas.
E ouso dizer, Pai, que após me libertar desse sinal na carne, eu revelarei na tua cara todas as verdades que tua mente mesquinha não aceita:
Eu uso brinco, pa-pai.
Meu cabelo é grande, pa-pai.
Eu faço arte, pa-pai.

EU DEI O MEU CU, pa-pai-zi-nho!

Agora, quero te dizer que me deserde.
Não faço questão de carregar comigo tua pele inchada,
tuas juntas fedidas, teus ossos podres.
Não faço questão. Pelo contrário.

Deserde-me pai.
Deserde-me.

Um comentário:

Márcio M Andrade disse...

Texto forte. Entregando as misérias do ser humano. Despojando-se de tudo o que foi ou desejou ser um dia, para encontrar quem, de fato, se tornou. Muito bom!